VOCÊ JÁ TEM
UM NOME ESPIRITUAL ?
Periodicamente
alguém me pergunta porque eu não uso mais o meu nome espiritual.
Aí, como é do
meu costume, resolvi elaborar as reflexões advindas desta pergunta e
compartilhar aqui neste texto.
Bem, em
primeiro lugar, eu não pretendo aqui dizer para você ter ou não um nome
espiritual, nem para afirmar que ter um nome espiritual é bom ou é ruim, é
certo ou errado, é fundamental ou dispensável.
Só pretendo
desenvolver o tema em função da minhas vivências e experiências pessoais nessa
área e dividi-las com vocês.
Desde os meus
20 anos de idade, quando comecei a praticar Yoga, tenho meus pés “atolados na
jaca indiana”, ou seja, desde esta época venho estudando, pesquisando e
praticando esta cultura e suas filosofias e técnicas.
E assim,
venho desde então me interessando por Yoga, meditação, Budismo,Tantra, Vedanta,
Ayurveda, mantras, deuses e Gurus.
Tive até
fases onde morei em ashram, ensaiei querer ser monje, enfim, embora nunca tenha
ido fisicamente à India, a India veio profunda e poderosamente a mim por várias
vias.
E seguindo
minha natureza aquariana eclética e universalista, nunca pertenci ou me filiei a
nenhuma instituição, seita ou organização religiosa, o que me deu muita
autonomia, independência e liberdade para circular durante muito tempo por todo
o universo oriental carioca, observando e aprendendo muito em todos os lugares
que frequentei.
Nesse pacote
que a India me ofertou, veio o privilégio de ter conhecido pessoalmente um ser
muito especial que meu coração reconheceu como sendo alguém que “chegou lá”, ou
seja, alguém que eu senti, intuí, que tinha alcançado o objetivo máximo que a
espiritualidade hindu pretende que seja a meta última da existência – a
Iluminação.
É claro que essa
aferição é absolutamente subjetiva e pessoal, já que não existe um
“iluminômetro” para determinar se uma pessoa se iluminou ou não.
O fato é que, para mim, foi bastante impactante
ter conhecido ao vivo e a cores uma pessoa que deu 3 voltas ao mundo descalço e
com dois panos enrolados no corpo (e assim ele esteve a 50 graus no Oriente
Médio e a mais de 20 negativos na Rússia), sem nunca portar nem pedir dinheiro,
e sem ter fundado nenhuma organização nem ter tido milhares de discípulos, e
cuja mente visivelmente não oscilava.
Ele era
realmente a encarnação da renúncia e do desapego.
Este ser –
Swami Tilak – esteve no Brasil nos anos 70 e retornou no início dos anos 80 (e
desencarnou em 84), quando o conheci, e quando eu estava no auge da minha “viagem”
monástica, querendo me iluminar ontem.
E dentro do
universo hindu, um Guru é peça fundamental neste processo. Ser iniciado por um
Mestre Espiritual verdadeiro é quase que fundamental nesse tipo de caminho. E
na iniciação geralmente se recebe um nome espiritual e um mantra para meditar.
Bem, swamiji
era muito resistente à ideia de iniciar pessoas e de ter discípulos, mas a
insistência amorosa e bem intencionada de um pequeno grupo de brasileiros que
“grudaram” nele igual aqueles bichinhos de luz que se amontoam em volta de uma
lâmpada acesa, fez com que ele humildemente aceitasse dar iniciação às pessoas
daquele grupo.
Estas
iniciações aconteceram de diversas formas para diversas pessoas.
Comigo, minha
iniciação começou quando pedi a ele um nome espiritual.
Lembro muito
bem, o estávamos acompanhando em um evento alternativo rural em Visconde de
Mauá. Estávamos andando numa estradinha
de terra indo para o local onde ele iria dar uma palestra, aí acionei a minha
“cara-de-pau” e pedí: “Swami, pode me dar um nome?” (ele já tinha dado nomes
para algumas pessoas). Ao que ele perguntou: “Por que você quer um nome”? E eu
prontamente respondi: “Porque o nome que meus pais me deram não significa nada
para mim”.
Ele parou, olhou
no fundo dos meus olhos, ficou um pouco em silêncio, e com a voz de trovão que
lhe era peculiar, falou: “Dharmendra”. E continuou andando.
Eu fiquei chapado,
atordoado, meio doidão ali no meio daquela estradinha da Mantiqueira, não tive
nem forças para perguntar o que significava (significa “Senhor do Dharma”), e
até hoje estou digerindo e entendendo o espírito e a função desse nome na minha
vida.
Quando um
Mestre verdadeiro te dá um nome espiritual, é como se fosse um mantra também. É
alguma potencialidade ou virtude que ele vê na sua alma e que você precisa
desenvolver.
Por outro
lado, este mesmo swami sempre dizia que usar um nome espiritual não deveria ser
como usar uma jóia, um enfeite, não deveria ser como um objeto decorativo na
sua vida, usado só para ter status.
Bem, e eu fui
publicamente Dharmendra durante 20 anos. Fiz questão que todos me chamassem
assim, inclusive os meus familiares. Imagina o choque para os pais que te deram
com o maior amor um nome e agora você meio que o renega...
E claro, na
época, na minha “arrogância aquariana”, eu me achava superior em relação ao que
(eu acreditava que) eram os meus pais, afinal eu era vegetariano (e eles não),
eu meditava e fazia yoga (e eles não), eu morava na roça em comunidade
espiritual (e eles não), eu fazia parte de um seleto grupo de “escolhidos” para
instaurar a Nova Era no planeta (e eles não)...enfim, eles eram pessoas muito
bacanas mas eram fundamentalmente caretas, burgueses, urbanos e carnívoros, e
era “óbvio” que um nome vindo deles não tinha nenhum significado maior nem tinha
a menor força energética e espiritual.
Ok. Isso tudo
vigorou até eu conhecer as Constelações Familiares.
Isso tudo foi
assim até eu aprender, entender, aceitar e me curar em relação aos meus
ancestrais. Até eu aprender a honrar, a ter profundo respeito e a ser imensamente
grato a absolutamente tudo o que me veio deles, inclusive o nome que me deram.
E hoje eu
acho totalmente infantil, ingênuo e até ignorante achar que o nome que eles me
deram não tem significado nem força.
A partir daí,
preferi guardar meu nome espiritual em meu coração como um elo interno e eterno
entre eu e este ser especial que me deu este nome.
Hoje já não
tenho mais meus pés atolados apenas na jaca indiana, mas também em outras jacas
(como as culturas nativas e as terapias sistêmicas e transpessoais)
Hoje sou um
ser humano comum (sem pretensões de ser santo nesta vida), sou terapeuta e
trabalho com pessoas de todos os credos e crenças, e por isso prefiro me manter
publicamente mais neutro.
E dessa
forma, não uso roupas devocionais nem cerimoniais, nem batas indianas, penas,
colares, nem nenhum adereço ou adorno religioso ou ritualístico de nenhuma
cultura, justamente para que eu não seja identificado com algum caminho em
especial.
Isso de
alguma forma poderia induzir as pessoas a terem sobre mim alguma leitura
determinada - achando que eu pertenço a alguma religião ou caminho espiritual
específico, ou que sou superior a elas por ter um nome espiritual ou por usar
adornos e adereços rituais - e isso poderia limitar o numero de pessoas que se
aproximam de mim e do meu trabalho.
Se você acha
que ter um nome espiritual e usa-lo publicamente é muito importante, bacana.
Siga o seu coração.
Mas lembre-se
que o ideal é receber um nome espiritual de alguém a quem você realmente se
vinculou de forma verdadeira e profunda como seu Mestre, como seu Guru, e com o
caminho que ele te oferece.
Isso vale
também para quem segue o caminho nativo, o Xamanismo. Aliás, eu também recebi
nomes espirituais no caminho nativo. Dois nomes. Só que nestes casos não foi
porque eu pedi, mas espontaneamente os índios me deram.
Existem
algumas organizações e mestres que saem dando iniciações e nomes espirituais rapidamente,
antes que haja efetivamente um profundo vinculo com o mestre e com a sua escola,
até como uma forma de atrair mais as pessoas.
E isso acabou
meio que desencadeando quase que uma moda. Quase todo mundo que entra nesse
universo espiritual – hindu ou xamânico - quer ter um nome espiritual.
E aí pode-se facilmente
cair no ego de se sentir “o cara” por ter um nome espiritual, e, como dizia
Swami Tilak, ficar usando um nome espiritual como quem usa uma bijuteria para se
enfeitar, e para se sentir pertencendo a um grupo seleto de pessoas especiais.