sexta-feira, 26 de junho de 2015

SOBRE O TRABALHO : SER, FAZER OU TER?

Somos realmente uma sociedade “trabalhólatra”.

É impressionante como tanto nos sistemas capitalistas quanto nos regimes comunistas/socialistas o trabalho é um termômetro e um parâmetro que determina e estabelece a importância e a qualidade do ser humano, individual e coletivamente.

E não tenho como não me lembrar do meu querido e saudoso amigo e terapeuta Alex Fausti que dizia que somos uma sociedade escrava e refém do FAZER, porque o nosso valor é medido pelo que fazemos e produzimos, e não pelo que somos.

Me lembro bem de quando, em uma sessão de terapia, ele traçou em um papel três círculos concêntricos, dizendo que no centro estava o SER, no circulo seguinte o FAZER e no mais externo, o TER.

E dizia que deveríamos ter nosso eixo estabelecido no SER, e assim transitarmos livremente (e conscientemente) pelo FAZER e pelo TER.

Mas por algum motivo, deslocamos este eixo para o FAZER, e a partir daí temos referenciado a nossa vida e a qualidade dela na qualidade e na quantidade do que fazemos.

O mais terrível, é que este eixo vem se deslocando para o TER, que é tudo o que o sistema capitalista globalizado com seus marketings e merchandisings deseja, ou seja, que passemos a pensar e a sentir que só somos quando temos.

E lembro também do precioso “dever de casa” que ele me passou quando eu era seu cliente, que era separar algum momento do dia ou da semana para treinar SER,ou seja, para “não fazer nada”.

Eu deveria deitar numa rede, por exemplo, e num primeiro momento perceber os movimentos da minha mente incomodada (e eventualmente culpada e entediada) por não estar fazendo nada.

Num segundo momento, deveria tentar esvaziar esta mente crítica e julgadora e me entregar totalmente ao prazer do momento presente.

Nessa esteira, lembro também de outra pessoa muito importante na minha vida, um swami indiano também falecido chamado Swami Tilak, que achava surreal como nós não sabíamos estar inteiros no que fazíamos e também quando não fazíamos nada.

Ele dizia que nós trabalhávamos pensando nas férias e tirávamos férias pensando no trabalho...

Claro que não estou fazendo aqui a apologia da vagabundagem, mas hoje já consigo entrar na perspectiva do ócio criativo, do não fazer pleno.

Trabalhar – profissionalmente falando - é importante, é fundamental, porque nele expressamos nossos talentos, potenciais, capacidades e vocações, podendo assim não só contribuir para a sociedade presente e futura, como também receber a remuneração financeira que nos permite (pelo menos deveria permitir) sobreviver e desenvolver uma vida próspera, saudável e rica em experiências.

Poderiamos aqui então fazer o exercício de estender a concepção de trabalho para praticamente tudo na vida: por exemplo, meditar e fazer terapia é fazer trabalho interno, ler e estudar é fazer trabalho intelectual, fazer exercícios e ter uma boa alimentação é trabalhar nosso corpo, fazer caridade e serviço social é trabalhar pelo próximo necessitado, e por aí vai.

E aí poderíamos dizer que tudo na vida é trabalho, não é?

E num segundo momento deveríamos entender que tudo deve ter um equilíbrio e uma harmonia para ser saudável e promover real crescimento e expansão.

Ou seja, tudo em excesso é prejudicial. Seja trabalho profissional, sexo, comida, computador, exercícios físicos,etc.

Tanto que hoje existem instituições tipo AA (Alcoólicos Anônimos) para tudo isso que citei acima, pois existem pessoas que são workaholics, sexólatras, comedores compulsivos, malhadores compulsivos, usuários compulsivos de informática e vídeo game, só para citar alguns.

Então vamos tentar ressignificar a importância do FAZER (e do TER) na nossa vida, que só se super dimensiona quando a consciência do SER está sub dimensionada em nós, e aí o FAZER e o TER vão tentar compensar esta sensação de vazio e de falta.

Só que o FAZER e o TER são como uma droga, isto é, são insaciáveis, pois o complexo 5 sentidos/mente/ego quando imersos na carência e na sensação de falta, é insaciável e vai tentar através do FAZER e do TER anestesiar a dor e a angústia da sensação de não SER.
E esta dor e angústia de não SER vão aparecer na superfície como dor e angústia por não FAZER e por não TER.

Vamos então (re) aprender a só SER?


ERNANI FORNARI

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